Cinco novas ações civis apresentadas no Texas ressurgem uma realidade desconfortável da guerra na Ucrânia: apesar das sanções ocidentais, componentes tecnológicos fabricados por grandes marcas americanas continuam a aparecer em armamentos utilizados pela Rússia. As ações, movidas por grupos de civis ucranianos, acusam a AMD, Intel, Texas Instruments e uma empresa de distribuição ligada à Berkshire Hathaway de não terem tomado medidas suficientes para evitar que seus produtos chegassem a mãos sancionadas por meio de revendas, intermediários e mercados paralelos.
O advogado que representa os demandantes se destacou ao classificar essas empresas como “merchants of death” (mercadores da morte) e tecer críticas sobre “ignorância deliberada” ou negligência corporativa ao lidar com os desvios de seus produtos.
As acusações centrais não envolvem a venda direta para a Rússia, uma prática que as grandes empresas de tecnologia americanas interromperam após a invasão de fevereiro de 2022. Em vez disso, apontam que o controle da cadeia de suprimentos teria sido insuficiente para impedir que chips e outros componentes fossem “reexportados” por terceiros e acabassem integrados em drones e mísseis. Documentos judiciais citam incidentes entre 2023 e 2025 onde componentes de AMD e Intel foram encontrados em sistemas de armas, incluindo drones de fabricação iraniana e mísseis de cruzeiro e balísticos. Os demandantes argumentam que um padrão repetido de desvio exige mais do que simplesmente afirmar que “cumprimos a lei”: é necessário demonstrar medidas razoáveis para detectar e impedir esses desvios.
Além dos fabricantes, outro foco relevante são os canais de distribuição. O texto menciona a Mouser Electronics, uma empresa ligada à Berkshire Hathaway através de sua estrutura corporativa, destacando a complexidade do mercado de componentes, onde uma venda direta do fabricante para um exército é rara. Existe uma extensa rede global de distribuidores, revendedores e intermediários, o que facilita que componentes previstos para mercados específicos acabem em locais indesejados. Essa lacuna é o que as ações judiciais buscam transformar em responsabilidade civil.
Em resposta às alegações, Intel reiterou que suspendeu seus envios para Rússia e Bielorrússia no início do conflito, impondo normas semelhantes a fornecedores e distribuidores. Já a AMD e a Texas Instruments reafirmaram sua conformidade com as sanções, embora não tenham apresentado declarações sobre as novas demandas no momento da veiculação das notícias.
A questão, no entanto, não é tão simples para o público em geral; a discussão se estende além de “vendeu para a Rússia” ou “não vendeu”. O conflito legal em construção se aprofunda na reflexão sobre o que constitui a diligência necessária para evitar o desvio de componentes de uso geral, em um cenário com intermediários opacos e redes de revenda internacionais.
Se essas ações prosperarem, poderão resultar em maior pressão regulatória sobre controles de conformidade, fazendo com que o investimento aumente e impactando transações legítimas, especialmente em operações B2B. Além disso, a reputação de grandes marcas como AMD, Intel e Texas Instruments pode ser afetada, uma vez que o público não distingue entre vendas diretas e desvios por terceiras partes.
Por fim, a guerra está reformulando discussões sobre tecnologia e ética empresarial, arrastando toda a indústria, dos fabricantes aos distribuidores, para um debate que promete evoluir à medida que os efeitos geopolíticos se intensificam.






