A habitação se tornou um dos tópicos centrais do debate social e político na Espanha. Com a constante alta dos preços, o acesso a um lar se torna cada vez mais complicado para famílias e jovens. Porém, além da especulação imobiliária e da escassez de oferta, um fator fundamental contribui para o problema: a elevada carga fiscal sobre o setor.
Dados do Instituto de Estudos Econômicos indicam que, em 2024, o governo arrecadou mais de 50 bilhões de euros em impostos relacionados à habitação, o que representa cerca de 3,5% do PIB nacional. Essa cifra impressionante contrasta com o escasso investimento em políticas públicas de habitação, que mal chega a 0,5% do PIB. Essa disparidade coloca a Espanha entre os países da OCDE que mais pesam a tributação sobre a propriedade imobiliária, quintuplicando a média dos parceiros europeus.
Um dos cálculos mais relevantes é que um em cada cinco euros do custo de uma habitação na Espanha refere-se a impostos. Assim, um apartamento de 300.000 euros poderia custar cerca de 240.000 euros se fossem eliminadas as cargas fiscais. Esse diferencial de 60.000 euros poderia representar um alívio significativo para uma família, possibilitando a entrada em uma hipoteca ou reduzindo os juros ao longo de décadas.
A estrutura tributária é complexa e começa desde a aquisição do terreno pelo desenvolvedor até as taxas e impostos que impactam a construção e a venda de imóveis. Um total de 16 figuras tributárias diferentes afetam a construção e o comércio de imóveis na Espanha, o que justifica a alta carga fiscal total, que eleva o preço de mercado em cerca de 20% adicional.
Em comparação com a Europa, a situação é ainda mais preocupante. A Espanha está entre os países com maior carga fiscal sobre a habitação, com um imposto efetivo sobre a compra de imóveis em torno de 11%, ocupando o terceiro lugar mais alto na OCDE, atrás apenas da Bélgica e do Reino Unido. Além disso, a tributação sobre as plusvalias, que chega a 30%, também supera a média europeia, que gira em torno de 16,4%.
As consequências desse modelo fiscal são claras. A Espanha destina uma parcela significativa de sua política fiscal à tributação de um bem essencial, resultando em preços de habitação que já chegam a níveis de bolha. Enquanto os jovens enfrentam inacessibilidade, o Estado arrecada montantes recordes nesse setor, mas reinveste de forma irrisória em habitação social. A Espanha conta com apenas 1,7% de seu parque habitacional destinado a habitação social, em comparação com 9% da média europeia.
Especialistas sugerem medidas para mitigar essa situação, como a redução do IVA de 10% para 4% em vendas de primeira residência, ajuste da tributação sobre plusvalias para desconsiderar ganhos fictícios devido à inflação, e a realização de incentivos à reabilitação com impostos reduzidos e deduções fiscais. Contudo, a questão crucial é: qual administração está disposta a abrir mão de uma parte da sua arrecadação?
A Espanha se encontra em um dilema fiscal: manter a taxa atual perpetua a inacessibilidade da habitação, enquanto reduzi-la comprometeria receitas vitais equivalentes a gastos em áreas como educação. Nesse cenário, os cidadãos enfrentam a dura realidade de que a hipoteca média já consome 7,5 anos de salário bruto e as prestações representam 39% da renda familiar, um recorde em uma década.
Em suma, a pesada carga tributária sobre a habitação na Espanha a coloca em uma posição desfavorável em comparação com seus vizinhos europeus, se tornando um motor financeiro para o Estado, mas às custas de dificultar o acesso a um direito fundamental. A verdadeira questão não é somente se os impostos devem ser reduzidos, mas como realizar essa redução sem comprometer as receitas públicas e, sobretudo, como transformar essa carga fiscal em uma ferramenta que facilite o acesso à habitação em vez de complicá-lo.