ASML no centro da disputa tecnológica entre Ocidente e China
A gigante holandesa ASML, líder mundial na fabricação de equipamentos de litografia para a produção de chips, volta a estar no epicentro da tensão tecnológica entre o Ocidente e a China. Um relatório da televisão pública holandesa, Nieuwsuur, revelou que a empresa tem como cliente na China pelo menos uma companhia com laços com o Exército Popular de Libertação, além de um renomado instituto em tecnologias quânticas.
A ASML confirmou a venda de máquinas a vários clientes chineses, mas defende que todos os envios foram realizados de acordo com a legislação de controle de exportações, seja com licença explícita ou utilizando equipamentos não restritos. Contudo, essa situação reacende o debate sobre a capacidade da chamada “tecnologia antiga” – sistemas DUV, que antecedem as avançadas EUV – em potencializar a corrida tecnológica e militar da China.
O Nieuwsuur informou que a ASML forneceu equipamentos e componentes a uma filial do China Electronics Technology Group (CETC), um conglomerado estatal e fornecedor do Exército chinês, além de colaborar com a Shenzhen International Quantum Academy e fabricantes como a SiEn (Qingdao) e SMBC, uma subsidiária da gigante chinesa SMIC.
A empresa argumenta que os sistemas vendidos foram de litografia de luz profunda (DUV) e não suas máquinas de luz ultravioleta extrema (EUV), fundamentais para a produção de chips avançados. No entanto, a linha entre “antigo” e “novo” na prática é muito mais tênue. Equipamentos DUV avançados já permitiram que a SMIC produzisse chips de 7nm, contornando parcialmente as restrições internacionais. Além disso, para muitas aplicações militares, nodes mais antigos, como 28nm e 40nm, ainda são considerados suficientes.
Embora a ASML não esteja enviando EUV para a China, suas máquinas DUV permanecem estratégicas no ecossistema de semicondutores e, por consequência, nas capacidades militares e de inteligência do país. Com a China se tornando seu maior mercado, representando cerca de 36% de suas vendas em 2024, a situação se torna delicada para a empresa, que enfrenta pressão geopolítica dos Estados Unidos para restringir o acesso chinês a tecnologias avançadas.
A questão se complica ainda mais pela dependência da ASML, que vê a China como uma fonte crucial de crescimento, tornando-se um dilema entre proteger seus interesses comerciais e respeitar as preocupações de segurança nacional. O recente caso também gera escrutínio interno e reforça a percepção de que o setor de semicondutores é uma questão de segurança nacional para o governo holandês.
A referência ao Shenzhen International Quantum Academy no relatório é alarmante para muitos analistas, que temem que a ASML, mesmo indiretamente, esteja contribuindo para a infraestrutura que pode apoiar os avanços quânticos na China. As implicações da computação quântica são vastas, afetando criptografia, defesa e comunicações seguras. Especialistas afirmam que o argumento de “tecnologia antiga” é insuficiente e que é crucial analisar as capacidades industriais e de design que estão sendo desenvolvidas.
O caso ASML ilustra bem o desafio enfrentado pela Europa em equilibrar a proteção de suas indústrias e o respeito às preocupações de segurança nacional, especialmente em um contexto onde os laços com empresas vinculadas ao complexo militar-industrial chinês estão sob intenso escrutínio. A pressão para endurecer os controles de exportação deve continuar aumentando, enquanto a linha entre negócios e geopolítica se torna cada vez mais indistinta no mundo dos chips.





