No contexto da tecnologia, grandes movimentos não ocorrem da noite para o dia. É necessário estratégia, visão e, acima de tudo, ler bem a partida. E é exatamente isso que as principais empresas taiwanesas de manufatura eletrônica estão fazendo: investindo bilhões de dólares em território americano, assegurando assim um lugar privilegiado na corrida global pela inteligência artificial (IA).
A atual situação não se limita a negócios; envolve também questões geopolíticas, logísticas e, em muitos casos, a própria sobrevivência.
O aumento da IA nos últimos dois anos gerou uma demanda crescente por servidores que suportem modelos complexos. Empresas como Wistron, Foxconn, Quanta e Wiwynn viram seus pedidos dispararem, especialmente de gigantes da nuvem que buscam infraestrutura imediata. Porém, essa euforia tecnológica é acompanhada por tensões comerciais entre os EUA e a China, fazendo com que Washington impuses novas restrições e tarifas que afetam componentes cruciais. A resposta de Taiwan? Transferir parte da produção para os próprios EUA.
Wistron destinou 45 milhões de dólares à sua subsidiária na Califórnia para fortalecer a capacidade de desenvolvimento e montagem de servidores de IA. Foxconn investiu 128 milhões em novas instalações em Houston e na Califórnia, com o objetivo claro de estar mais próximo de seus clientes americanos e reduzir riscos logísticos. O Texas, com seu ecossistema tecnológico em expansão, se torna um dos novos centros da IA, onde Quanta já opera e Wiwynn planeja movimentos estratégicos.
Taiwan, que fabrica mais de 80% dos sistemas de servidores e mais de 90% das placas-mãe do mundo, realiza atualmente menos de 15% dessa produção na América do Norte. Essa desproporção torna os fabricantes vulneráveis a interrupções e aumentos de custos devido a questões políticas ou logísticas. Com a IA acelerando o ritmo de investimento, as empresas estão cada vez mais conscientes da necessidade de produzir mais perto do cliente final.
Essas investidas não são improvisadas. Segundo analistas do setor, as empresas taiwanesas de EMS buscam se posicionar como parceiras estratégicas da indústria de IA nos EUA, e não apenas como fornecedoras. O recado é claro: para servidores de ponta, não é preciso buscar do outro lado do Pacífico; eles estarão montados a poucos estados de distância.
Esse movimento também representa novas oportunidades para a indústria americana, que poderá integrar sua cadeia de suprimentos de maneira mais eficaz com parceiros de alta capacidade tecnológica. No entanto, Taiwan permanece um competidor forte em termos de eficiência e custos, mesmo fabricando nos EUA.
Para os taiwaneses, o desafio consiste em manter sua margem enquanto se adaptam a um cenário com custos operacionais mais altos. Para os americanos, abre-se a oportunidade de reforçar seu ecossistema de IA com aliados que dominam o hardware.
O que está acontecendo entre Taiwan e os EUA no setor de IA serve como uma lição sobre adaptação. Assim como certas empresas que falharam em perceber a mudança para smartphones desapareceram do mercado, aquelas que não entenderem a velocidade e complexidade do mercado de IA correm o mesmo risco. As EMS taiwanesas decidiram não esperar o que acontecerá; elas se movimentaram, e o fizeram em grande escala.