A nova proposta do Governo pretende integrar todos os profissionais liberais no regime de trabalhadores autónomos (RETA), eliminando a possibilidade de contribuição através de mutualidades privadas a partir de 2027. O setor financeiro e jurídico alerta sobre o impacto dessa medida na gestão patrimonial de milhares de trabalhadores.
A proposição de lei, apresentada pelo Governo espanhol no final de 2024, que estabelece uma “passagem para o RETA” para os mutualistas, gerou intensa controvérsia no campo econômico e financeiro. O texto legislativo, ainda em fase de emendas, não apenas permite aos profissionais registrados —advogados, arquitetos, médicos, engenheiros, entre outros— transferir seus direitos para o sistema público de trabalhadores autónomos, mas também contempla a eliminação definitiva das mutualidades de previdência social como sistema alternativo a partir do dia 1 de janeiro de 2027.
As mutualidades de previdência social têm sido, historicamente, uma via alternativa ao RETA para determinados grupos profissionais. Trata-se de entidades privadas sem fins lucrativos, reguladas e supervisionadas, que permitem aos profissionais gerenciar suas contribuições e planejar sua aposentadoria de maneira individual, muitas vezes complementada com outros instrumentos de investimento, como fundos, imóveis ou seguros.
Esse modelo oferecia flexibilidade, controle sobre a poupança e vantagens fiscais. Contudo, desde 2023, as condições mudaram: os mutualistas são obrigados a contribuir no mínimo 80% do que corresponderia ao pagamento no RETA, o que reduziu significativamente a eficiência econômica do modelo.
Com a nova proposta legislativa, o Executivo dá um passo adiante, fechando o acesso a esse sistema para todos os novos profissionais a partir de 2027, homogeneizando a contribuição no sistema público. O objetivo declarado é garantir a equidade entre os trabalhadores, mas as implicações econômicas são profundas.
Sob a perspectiva financeira, a medida limita as opções de planejamento patrimonial a médio e longo prazo. A capacidade de gerenciar livremente o percentual destinado à previdência social, decidir o perfil de risco, diversificar os ativos ou ajustar a estratégia de poupança de acordo com o ciclo de vida fica seriamente comprometida.
Profissionais do setor legal expressam a preocupação de que a eliminação da alternativa das mutualidades empobrece o espaço de liberdade financeira para milhares de profissionais, impondo um modelo único, inflexível e sem capacidade de ajustar de forma personalizada.
Além disso, a discussão sobre a eficiência do sistema público de pensões ganha destaque, especialmente em um cenário de envelhecimento demográfico e déficit estrutural da Segurança Social.
Do ponto de vista fiscal, a mudança pode representar um golpe para muitos profissionais que utilizavam as mutualidades como instrumento dedutível, otimizando sua carga tributária por meio de contribuições regulares ou extraordinárias. A integração forçada no RETA, com taxas efetivas superiores a 35% da receita líquida, reduz o espaço de manobra fiscal, especialmente para aqueles com rendimentos variáveis.
A oposição ao texto não se fez esperar. Partidos como o Partido Popular, Vox e Junts manifestaram sua discordância, pedindo o respeito à liberdade de escolha entre mutualidades e o RETA. Organizações como Mutualistas por Futuro iniciaram campanhas de coleta de assinaturas e mobilização jurídica para frear a supressão do sistema alternativo, destacando a importância de uma economia moderna que deve fomentar opções e não eliminá-las.
Com a data limite de 2027 se aproximando, os profissionais que ainda não decidiram sobre o sistema precisam agir rapidamente. Avaliar o impacto financeiro e fiscal de continuar em uma mutualidade ou migrar para o RETA tornou-se uma decisão crítica. Os consultores financeiros recomendam realização de uma auditoria patrimonial completa, considerando fatores como idade, média de renda, ativos acumulados e capacidade de poupança.
Embora a tramitação da lei ainda esteja em andamento, o quadro se apresenta em transformação. Em meio a mudanças no sistema público, onde a sustentabilidade e as prestações começam a se mostrar frágil, blindar a liberdade financeira deve ser uma prioridade em qualquer política econômica robusta.